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U2, 'Songs of Innocence'



Não existe nenhuma banda como o U2. Comercialmente, o nome da banda é uma das propagandas que mais vendem, além de sua música se tornar dinamicamente forte e duradoura ao decorrer dos anos. Songs of Innocence marcou um novo som, uma nova etapa da banda de Dublin, Irlanda. Eles estão longe de serem aqueles garotinhos que estavam prontos para o underground e tudo o que ouvimos nestas 11 faixas são a mais nova criatividade diferenciada inexistente nos materiais anteriores – contendo um pouco de The Joshua Tree, de 1987, e Achtung! Baby, de 1991 – e voltando aos momentos de descoberta nos anos 1980, com discos como War, de 1983, e The Unforgettable Fire, de 1984. Mas o que mais me chamou atenção foi a sua estranheza, ou melhor, a sua diferenciação sonora.

Dentro disso, Songs of Innocence é o primeiro álbum em cinco anos demorados em que a banda esteve parada – dois anos inteiros para completar e elaborar este trabalho. Contudo, o nome do álbum foi tirado de uma coleção de poemas de William Blake, de 1979, mas seu contexto combina perfeitamente com o momento e a característica que o grupo tem para formar música em cima de temas tão grandes como os problemas do mundo, a fome, a inocência, o evangelho, etc. Bono é cada vez mais categórico em suas letras e composições, assim como The Edge continua sendo visionário em seus sons estranhos e diferentes extraídos da guitarra. Além disso, seu trabalho mistura figuras ilustres de verdadeiros exemplos para a humanidade como Martin Luther King e Nelson Mandela – homenageando Madiba depois de sua morte neste ano.
       
Contudo, a banda ainda mantém uma característica bem distinta das bandas do passado, como em "The Miracle (of Joey Ramone)", que contém uma guitarra de grandes distorções, mas nas duas faixas restantes, tudo parece muito semelhante com No Line on the Horizon, onde os vocais de Bono soam mais líricas do que os discos anteriores. Foi estranho perceber a mudança no tom de voz de Bono, mas agora me acostumei. Uma coisa que ainda percebo e que herda de seu antecessor, a bateria de Larry Mullen Jr. continua sendo menos destacada, e isso faz pensar – não só para mim, mas para o resto das pessoas – que a bateria é eletrônica e totalmente anônima. Songs of Innocence marca uma certa preocupação por parte da banda de como se reinventar, sendo que todas as suas inspirações anteriores deram certo – pelos menos na maioria de seu catálogo de álbuns. Claramente, o público alvo não olha entusiasmado para este trabalho, repetindo o prática em No Line on the Horizon, talvez por lembrarem da banda irlandesa em seus dias de glória.

As 11 faixas são fruto de uma inspiração resgatada a partir dos anos 1980, quando a banda começou no underground – ano de 1980 – mas demorou sete anos para sair do underground para chegar ao topo como uma grande banda de rock, superando todas as expectativas – inclusive daqueles que não creram que o U2 se transformasse em uma potência da música pop mundial. A banda ainda tem uma química invejável de compor músicas fantásticas e Songs of Innocence soa como se estes quatros irlandeses tivessem voltado ao tempo, voltado para sua juventude enérgica de querer o mundo. "Every Breaking Wave" soa como uma "Magnicent" linda e formosa, brilhando nos seus mais de quatro minutos, enquanto que "California (There Is No End to Love)" poderia ser uma canção incluída em seus primeiros discos como a estréia famosa de Boy, de 1980, a minimalista October, de 1981, e a guerrilheira e marchante War, disco que firmou o quarteto no underground em 1983.

Songs of Innocence está cheio de faixas resplandecentes e de uma beleza musical e natural de causar impacto. Muitos não se deram conta, mas este é um grande trabalho do U2. "Iris (Hold Me Close)" é uma jóia presente que me lembra muito as canções de The Unforgettable Fire, de 1984. É uma verdadeira viagem, voltando aos tempos bons, dias de glórias e conquistas do U2, aqui tem um pouco dos passeios de sua sonoridade de Berlin em Achtung! Baby – "The Miracle (of Joey Ramone)" – mas a maioria de seus sons atuais presentes em Songs of Innocence são muito mais a ingenuidade de seu rock alternativo marchante que espalhavam os "problemas" da guerra e da sociedade no ventilador. Fica muito claro que os primeiros 15 minutos – de "The Miracle" a "Song for Everyone" – foram essenciais para o ambiente do novo material do grupo se tornar em um álbum musicalmente sólido e equilibradamente consistente.

Porém, de "Raised By Wolves" até "The Troubles", as sonoridades soam poderosas, o contrário do tédio da segunda parte de No Line on the Horizon. São canções maravilhosas de se ouvir, contendo intimidades instrumentais bem típico de The Edge, com riffs de guitarras sampleadas e tocadas com distorções que te fazem partir para outro planeta. Por outro lado, "Volcano" mostra um lado em que o baixo de Adam Clayton se destaca melhor, o que é raro em uma faixa do U2. Durante os seus três minutos e quinze segundos, Bono dança vocalmente por seus falsetes e pela cozinha da bateria de Larry Mullen Jr. e do baixo de Clayton. Songs of Innocence é um renascimento do som alternativo genuíno que a banda deixou para trás quando gravou a sua óbra-prima, The Joshua Tree, em 1987. "Raised By Wolves" é bem aceitável, lenta, agradável e simples.

Depois de estarem cinco anos parados e escondendo informações sobre um novo material de inéditas, foi claro que a banda estava se preparando para o que estava por vir. Lançar um disco novo e não cobrar nada pelo esforço, pelo seu ganha-pão não é para qualquer artista. Thom Yorke, conhecido por ser o líder do Radiohead, provou isso e o U2 decidiu entrar na onda. A indústria fonográfica está caindo, levando um murro no queixo, mas o U2 está se esquivando enquanto pode. Até a capa de Songs of Innocence prova muito bem: ingenuidade, sinceridade, simplicidade. Volta às raízes: esta é a temática de Innocence, mas pode ser um tanto quanto previsível para você que quer uma volta fajuta aos dias de glória destes quatro irlandeses. Mas a grande diferença da indústria fonográfica e o U2, é que a banda se reinventa a cada novo disco que lançam, mas a indústria da música simplesmente parou no tempo. E quando se falam em parar no tempo, Songs of Innocence é mais um álbum do catálogo que mostra o que é e como inovar – neste caso isolado, na era digital.

Sim, com seu som repetitivo e que fora desenterrado 18 anos depois, seus planos deram certo. E quem duvidou que não daria?




Por Leonardo Pereira

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